O que é que o Covid e os defensores da Terra Plana têm em comum

Quero falar-vos de um tema que não podia ser mais atual – o Covid – e a questão de estarmos a entrar num mundo muito perigoso de opiniões, alarmismos sem nenhuma racionalidade.

Os defensores da Terra Plana são um exemplo claro do mundo que estamos a viver, onde as pessoas acreditam que há uma conspiração da ciência a dizer-nos que a Terra é redonda, quando na realidade ela é plana. Sim, não é comédia, isto é mesmo real! Há pessoas que acreditam que toda a ciência é uma conspiração e estão revoltadíssimas porque as andaram a enganar a vida toda, dizendo-lhes que a terra é redonda. Sem comentários!

Acredito que, em menor escala, mas algo parecido se esteja a passar com o Coronavirus, com pessoas a defender que este vírus é do mais perigoso que há, focando-se no número absoluto de mortes, esquecendo-se que morrem muitas outras pessoas devido a outras causas, e outras com a postura oposta, dizendo que estas mortes não significam nada em termos de mortes totais e portanto devemos desvalorizar este vírus.

O que me preocupa é que nenhum destes grupos olha para algo super importante: DADOS. E eu, confesso, estava um pouco mais inclinada para o segundo grupo, o de relaxamento de medidas, por causa do alarmismo e exagero dos media relativamente a esta questão. No meu caso, já tenho tanta desconfiança face aos media, que nisto do Covid só sabem lançar números sem a preocupação de uma análise séria, que quase que deixei de acreditar neles (o que também não é muito racional do meu lado e daí ter decidido fazer uma análise minha).

Decidi fazer a minha própria análise, sabendo sempre que, claro, por detrás dos números há uma história muito mais complexa e os números só me contam apenas uma parte da questão. Apesar de tudo, cheguei a conclusões bem mais relevantes do que me genericamente explicam os jornais.

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A azul está o número médio de mortes diário entre 2009 e 2019 e a laranja o número médio de mortes diário em 2020.

Em janeiro e fevereiro de 2020 o número de mortes diário era muito parecido à media de 2009-2019. A partir de março, o número de mortes diário em 2020 passa a ser, em média, 15% superior ao que foi entre 2009 e 2019. Isto significa que sim, em 2020, estão a morrer mais pessoas e esse valor tem alguma expressão. Em 2020, nos meses depois do Covid “entrar” em Portugal, morreram 15% mais pessoas em Portugal do que nos mesmos meses em anos passados.

Mais ainda, o número médio diário de mortes em 2020 é o mais elevado desde 2009 (não fiz a análise para dados antes de 2009), isto é, não houve nenhum outro ano em que se verificasse tantas mortes por dia como em 2020. O gráfico em baixo mostra exatamente isso.

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Então, Inês, defendes que devemos voltar ao confinamento?

Não! Já nem falo na Economia, mas sim, na nossa saúde mental. O que eu peço, ao governo, e que todos devemos exigir é que nos dê dados sérios e precisos!

Na realidade eu não sei se estas são mortes Covid ou mortes devido ao atraso em tratamentos, operações, etc, isto é, mortes derivadas da prioridade dada à Covid em prole de outras doenças mas não diretamente Covid. Assim como também não sei quem está a ser contagiado, em que condições e como se podem quebrar as cadeias de transmissão. Já ouvimos dizer que era nos transportes públicos, nos locais de trabalho e ultimamente ouvimos dizer que são nas reuniões familiares. Mas tudo me parecem suposições e, em particular nas reuniões familiares, formas de nos responsabilizar a nós, cidadãos, pela infeção, quando esta é uma responsabilidade política! Os argumentos de “já era esperado a subida do número de casos, como está a contecer com a Europa” não são válidos.

Só vamos conseguir conter o número de casos evitando o confinamento se os organismos competentes nos disserem de forma precisa e específica como estão a ocorrer estas transmissões e se este aumento de mortes é diretamente Covid ou indiretamente, isto é, mortes de outra natureza. Naturalmente que no início da pandemia era muito difícil termos estes dados, porque havia ainda poucos casos e, portanto, a generalização seria perigosa. Hoje, com com mais de 40 milhões de casos em todos o mundo e mais de 100 mil em Portugal, esses dados existem. Organizá-los, tratá-los e partilhá-los é um dever de um governo sério no combate a uma pandemia.

Planear de acordo com dados e partilhá-los com os seus cidadãos é uma responsabilidade política. Se o governo não o fizer, então permitam-me dizer que os responsáveis pelas mortes não são quem se reune com a família, como tanto nos têm vindo a dizer, mas sim os nossos próprios governantes.

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