Por esta altura já todas sabemos que o novo coronavirus, o COVID-19, foi considerado uma pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS) — uma doença que se espalhou por muitos países, e por quase todos ou todos os continentes, e que afeta um grande número de indivíduos. Toda a nossa atualidade gira à volta desta adversidade.
Também por agora já ninguém questiona as medidas de contenção tomadas para travar a propagação do vírus. Pelo contrário: com o avançar da calamidade foram cada vez mais as vozes a pedir diligências mais céleres e agressivas — nomeadamente as que chegaram a considerar tudo isto «um exagero» mudaram agora de opinião.
Estamos ao corrente da forma como se propaga o vírus, dos riscos associados e do que podemos fazer para minimizar o contágio e para nos protegermos uns aos outros (#stayhome), mas a maioria ainda não tem noção das consequências económicas que vamos enfrentar nos próximos meses — e do impacto das mesmas nas nossas finanças pessoais. Claro que a nossa saúde é o mais importante, mas a nossa saúde financeira também é fundamental para o nosso bem-estar.
Estamos envoltos em incerteza pois vivemos uma situação sem precedentes. Porém, é possível desenhar alguns cenários e tomar providências — e é disso que te quero falar. As perspetivas não são boas, não serão tempos fáceis para ninguém, mas podemos tentar minimizar os efeitos negativos, designadamente ao nível das nossas finanças pessoais.
Segue-se a minha visão, baseada no que estudei e naquilo em que acredito.
Contextualização
Vamos entrar em recessão económica ou mercado em baixa (bear market, como muitos já terão visto nas notícias ou redes sociais), situação que se verifica quando o mercado cai significativamente (em relação a máximos recentes) no meio de pessimismo generalizado e de sentimento negativo por parte dos investidores.
Trata-se de uma reação muito comum ao tipo de notícias que temos recebido ultimamente.
A expressão é geralmente usada em relação ao mercado de ações, mas pode ser aplicada a qualquer segmento do mercado financeiro (obrigações, imóveis, divisas ou matérias-primas, como o petróleo). A situação oposta é o mercado em alta (ou bull market), caracterizado pela subida, ou pela expectativa da subida, dos preços em geral. Os mercados financeiros tendem a anteceder o que vai acontecer na Economia dita “real”, ou seja, quando há uma queda dos preços no mercado financeiro, significa que muito provavelmente irá haver um abrandamento na Economia, com efeitos reais na vida de todos nós.
Os ciclos de mercado em alta e em baixa podem durar meses ou anos — é impossível prever — e muitas vezes não sabemos em qual nos encontramos, particularmente no início (como agora).
No entanto, com as decisões políticas que estão a ser tomadas para combater a propagação do COVID-19 torna-se claro que estamos perante o início de uma recessão económica — que, acredito, será profunda mas não de longa duração. Queda da produção, aumento do desemprego, diminuição do PIB, redução do rendimento das famílias, queda do consumo, eventual descida de preços (tanto de bens como de imóveis), etc.
Estabelecimentos comerciais, de restauração, turismo ou lazer a fechar portas, trabalhadores independentes (freelancers) a ficar sem clientes, pequenas empresas sem capacidade para manter a sua atividade — e em simultâneo um Estado que se vê obrigado a aumentar os seus encargos (com a saúde e apoios sociais extraordinários) enquanto recebe menos contribuições.
A dimensão e as nuances dependerão da duração desta crise, mas de uma forma geral o cenário será esse. No entanto, acredito que não será uma crise duradoura, e que estamos mais preparados do que nunca para lidar com ela como sociedade. Poderá não parecer uma prioridade, mas não é altura para descurarmos as finanças pessoais.
Aliás, embora me custe falar de vantagens ou oportunidades financeiras num momento como este, uma recessão que deriva de uma ameaça à saúde pública, devo referir que é uma altura muito favorável para investir, se tivermos essa folga extra no nosso orçamento.
Como gerir as finanças pessoais neste contexto?
É altura de nos focarmos na melhor gestão possível do nosso dinheiro — e se possível também em poupança — destacando-se que várias pessoas enfrentarão queda de rendimento, mesmo aquelas que têm um emprego estável. Nesta fase o investimento deve ficar para aqueles que têm fundos de reserva aos quais não precisam de recorrer agora — ou nos próximos tempos.
Algumas considerações:
– Tens um fundo de reserva (ou fundo de emergência)? Poupança capaz de cobrir 6 meses dos teus gastos? Se precisares, esta é uma das situações em que faz sentido usá-lo — com gastos indispensáveis/essenciais, claro, não falo em compras supérfluas. Não te sintas mal por fazê-lo. É um fundo de emergência. Foi para isso que poupaste, é para isso mesmo que serve.
– Tens investimentos? Caso tenhas investimentos é provável que estes se encontrem no vermelho — mas vender agora será uma má decisão. Se não precisares de liquidez evita ceder às emoções. Enquanto não venderes, não estarás realmente a perder — e o mercado voltará a subir. No médio/longo prazo irás recuperar. Não sou eu que o digo, é a História.
– Caso não tenhas um fundo de emergência, e caso tenhas essa possibilidade, procura começar a poupar uma parte do teu rendimento para os tempos que se seguem. Esta é também uma oportunidade única para nos focarmos no essencial e para calcularmos o valor mínimo mensal de que precisamos para viver, utilizando o restante para poupança ou investimento.
Como ganhar dinheiro — ou mais dinheiro — neste contexto?
Foquemo-nos em dois grupos de pessoas em contexto de recessão económica: aquelas que se encontram ou que se veem repentinamente sem trabalho e aquelas que procuram um rendimento extra à sua remuneração regular para encararem despesas adicionais, apoiarem familiares ou criarem alguma poupança/capacidade de investimento — tudo é válido.
Uma forte opção para estas situações será o trabalho remoto, online — tão pertinente no momento de isolamento ou quarentena que vivemos. Ao contrário do que se pensa à partida, o trabalho remoto pode ser viável em quase todas as áreas profissionais. É uma questão de criatividade e adaptação — e sabemos que a necessidade aguça o engenho.
Como adaptar a tua área de conhecimento ao online?
Com aulas, consultas ou sessões individuais ou em grupo via plataformas de comunicação com voz e vídeo; com explicações online; com a criação e venda de e-books temáticos, teóricos ou práticos; com a criação e comercialização de receitas ou ementas personalizadas; com webinars; com workshops; com a criação de cursos online… Não há limite.
E estas são possibilidades para quase todas as profissões: professores, nutricionistas, designers, designers de interiores, psicólogos, tradutores, arquitetos, advogados, programadores, consultores, coaches, fotógrafos… — ou mesmo para profissões que pressupõem contacto, como médicos, dentistas, massagistas, esteticistas.
De salientar também que momentos de crise conduzem frequentemente a reinvenção pessoal e/ou mudança de carreira. É importante ter a mente aberta. Acredito que esta crise terá isso de positivo: obrigar a sociedade a repensar a forma como trabalhamos, focando-nos no que efetivamente é produzido e deixando de olhar para as horas trabalhadas.
Como investir neste contexto?
Investir não será uma prioridade para a maioria nesta altura. Porém, quem tiver essa possibilidade agora não deverá hesitar: é uma excelente oportunidade. Como referi, os mercados financeiros tendem a prever o que irá acontecer na economia real: antes de se verificar recessão o mercado cai e antes de se verificar recuperação da economia o mercado começa a subir.
Com exceção dos investimentos de capital garantido, como certificados de aforro e tesouro ou PPR seguros, o mercado financeiro está, como referido, a desvalorizar — o que à partida é um bom indicador para investimento («à partida» pois ainda se verifica bastante volatilidade e poderá cair mais, mas é certo que voltará a subir; dentro de meses ou anos, mas subirá).
Assim, se puderes investir nas próximas semanas e «esqueceres-te» desses fundos (ou seja, ignorar que no curto prazo o mercado ainda poderá cair mais) não vaciles. Podes diversificar a tua carteira entre PPR, ETFs, mercado imobiliário, certificados do tesouro ou aforro ou outros investimentos — e deixar o teu investimento a crescer. Esta é uma situação «comprar em baixa, vender em alta».
E neste ponto faço duas ressalvas sobre dois tipos de investimento concretos:
– Se o investimento no mercado imobiliário tiver como objetivo a compra para arrendamento a terceiros, deverá ter em conta que os valores das rendas irão cair em sintonia com a economia e a disponibilidade financeira dos portugueses, ou seja, o rendimento que iremos obter do imóvel irá reduzir-se face ao que teria nos últimos anos;
– Uma vez que as plataformas peer to peer são uma opção de investimento recente, que nunca «viveu» uma recessão, e estão muito associadas a pequenos negócios, empresas ou start-ups (entre os maiores prejudicados em contexto de crise), não poderemos ter uma ideia do seu comportamento nos próximos tempos. O investimento nas mesmas é um tiro no escuro neste momento, para muitos demasiado arriscado.
Conclusão
Foca-te na tranquilidade financeira possível nesta altura — para o curto e, se possível, médio/longo prazo. Mesmo que não te pareça uma prioridade agora. Equilibra as tuas finanças pessoais eliminando todos os gastos dispensáveis e foca-te no básico. Se ainda não a tens, obtém gratuitamente a ferramenta de controle dos gastos pessoais e começa hoje a anotar todos os teus gastos. Se possível (e se ainda não o tiveres feito) vai concebendo um fundo de emergência, ou seja, 6 meses do valor dos teus gastos mensais num depósito a prazo, certificados de aforro ou qualquer outro produto de capital garantido.
Se não precisares de liquidez no imediato, não vendas investimentos que tenhas feito no passado (se forem diversificados e se seguirem uma estratégia que ainda consideras válida). Mesmo que estejam em espiral descendente — voltarão a subir. E se tiveres capacidade para investir agora, esta é uma boa altura para fazê-lo.
Se precisares de rendimento extra, seja qual for a razão, sê criativa. Volta-te para o online.
Os próximos tempos não serão fáceis para ninguém, mas temos de acreditar que vamos sair mais fortes, com maior conhecimento, desta crise. Que o drama que vivemos atualmente sirva para refletirmos no que realmente importa e para que saibamos como evitar estas calamidades no futuro. Muita força a todas nos próximos tempos. Vai ser duro, mas vai ser rápido!
Disclaimer: A autora do blog Mais Que Poupar não está registada como analista financeira nem como consultora autónoma, não providenciando recomendações ou aconselhamento financeiro, nomeadamente no que diz respeito à aquisição ou transação de instrumentos financeiros. Todo o conteúdo presente neste blog tem apenas fins informativos e educacionais, sendo qualquer decisão de investimento baseada nos conhecimentos educativos adquiridos no presente website da exclusiva responsabilidade da leitora. O/a leitor(a) deve recorrer a aconselhamento junto de um profissional quando o seu perfil de risco e a tipologia dos instrumentos assim o exijam.
7 respostas
Estou a adorar o blog mas não posso deixar de fazer esta correcção: “Foi para isso que poupas-te”. É “poupaste” , obviamente.
ahhh odeio esse erro, obrigada!!